Nelson Fontana, corretor de seguros e advogado

Dr. Alessandro Octaviani, superintendente da SUSEP nomeado pelo atual governo, membro da equipe econômica do Ministro Fernando Haddad, no recente CONEC presentou os corretores de seguros com uma palestra onde apresentou as metas do governo para o Mercado Segurador:

• Ampliar o acesso ao seguro

• Melhorar a qualidade dos serviços

• Conectar a massa de ativos do Mercado Segurador aos grandes projetos de desenvolvimento nacional

A primeira proposta, ampliar o acesso ao seguro, significa fazer com que a massa de não segurados passe a consumir seguros. Esta proposta pode ser vista pelo lado positivo, que diz que o Governo quer ajudar o Mercado a atingir faixas da população que não consomem seguros atualmente. Isto, pode ser bom, mas pode também significar o Governo querendo ampliar o acesso ao seguro usando “os seus canais”, como a Caixa Econômica Federal.

Esta proposta pode ser vista também como uma crítica, afirmando que o Mercado está acomodado em vender seguros lucrativos para as “elites”, sem se preocupar com o lado social do seguro, de proteger os mais carentes. Será que o Governo sabe do trabalho que nós, os corretores de seguros, fazemos? Confia que estamos trabalhando duro para levar serviços de seguros a todos brasileiros? E se não conseguimos uma maior penetração, é porque existem fatores estruturais como falta de poder aquisitivo para comprar bens seguráveis ou investir em proteção. As estatísticas falam que 60% da população tem renda de até dois salários mínimos. Francamente, o Governo sabe o que é vender um seguro para uma pessoa que ganha R$ 2.640,00. Estes consumidores tem carros? Tem casas? Conseguem comprar comida, TV, pagar conta de luz, gás, água, comprar celular e ter internet? Com R$ 2.640,00? Todos estes itens estão na frente em termos de prioridade e se vendemos um seguro para este cidadão podemos estar deixando os filhos dele com fome.

Temos que pensar que nosso Mercado é essencialmente de SEGUROS PRIVADOS. Não atuamos em seguros sociais. Aliás nos tiraram o seguro de acidentes do trabalho que é tradicionalmente, na Europa e EUA, um seguro privado. Mapfre e Liberty são originalmente seguradoras de acidentes do trabalho, nos seus países de origem. Os corretores bem que gostariam de ver o seguro de acidentes do trabalho ser privatizado, abrindo novas oportunidades para corretores e seguradores. O trabalho de recuperação de acidentados nos países onde o acidente do trabalho é privado, é muito bom e efetivo. A iniciativa privada poderia prestar um excelente serviço à sociedade brasileira assumindo o seguro de acidentes do trabalho.

Gostaríamos muito também que o Governo parasse de intervir no seguro DPVAT, o seguro obrigatório de veículos. O que vimos no passado foi um mar de privilégios, corrupção e favorecimento de alguns com o dinheiro da população. A falta de controle da operação após a ingerência do Governo no seguro de DPVAT foi tão grande que, mesmo sem cobrar, o DPVAT está pagando os sinistros há quase dois anos. Como explicar isto? Se esta operação passasse a ser disponibilizada ao público como um seguro privado normal, abriríamos novas oportunidades para seguradores e corretores. Os agentes de seguro na Espanha e Itália viveram durante muitos anos tendo como base o seguro de DPVAT. Eram como “pequenos corretores” com lojas espalhadas pelas cidades, onde a população ia comprar o seguro obrigatório. Naquele momento, os agentes aproveitavam e ofereciam o seguro auto e responsabilidade civil excedente e seguro de residências. O Governo só atrapalha no seguro DPVAT. Em regime de concorrência teríamos um serviço muito melhor para a população. Poderíamos usar um adesivo no vidro da frente do carro, como se faz na Europa, para a policia identificar rapidamente quem não contratou o seguro obrigatório. Simples. Tem carro? Procure um corretor de seguros e faça seu seguro obrigatório. Você ganha o adesivo e cola no vidro da frente. A cada ano um adesivo com uma cor diferente. Ao procurar o corretor, obviamente, a classe conseguiria aumentar muito a venda de seguro automóvel por meio de cross selling. Simples e óbvio. Sem corrupção.    

A venda de seguros para a Classe E, formada por pessoas abaixo da linha de pobreza, com dificuldades alimentares é obviamente um problema que o Mercado Segurador não pode resolver. Mas será que não existe uma acomodação da classe dos corretores na ampliação das vendas de seguros para as classes C e D? As Classes A e B são bem atendidas. Os corretores ainda se apoiam muito no atendimento pessoal para servir as necessidades de seguro da população. Isto é caro.

Uma coisa que confunde aqui no Brasil é que todo intermediário é chamado de corretor de seguros. Na Inglaterra, por exemplo, um corretor não pode ter qualquer vinculação com uma seguradora, exigindo-se que ele seja um consultor absolutamente independente. No Brasil temos corretores que se instalam dentro de prédios de seguradoras e praticamente só oferecem os seguros daquelas seguradoras. Corretores que operam dentro de agencias bancárias com contratos que exigem que ele só ofereça seguros da seguradora do Banco. Na Europa estes intermediários são chamados de agentes e não podem usar a expressão “brokers”.

Como no Brasil corretor de seguros é sinônimo de “intermediário”, qualquer que seja ele, as STARTUPS que podem ampliar muito o acesso aos seguros, devem ser constituídas na forma de corretoras de seguros, apesar de que serão, na verdade, vendedoras massificadas de pequenos seguros que não exigem uma assessoria tão pessoal para serem contratados. Algumas seguradoras estão se lançando no mercado oferecendo venda direta ao consumidor, via tecnologia, mas esta é uma experiência que já não deu certo em outros mercados. Uma coisa muito negativa na venda lastreada em tecnologia é acessar o “fabricante” do produto para fazer a compra. Os consumidores gostam de falar com gente independente que apresente propostas de vários fabricantes. Quem compra passagem aérea no site da Cia Aérea? É muito melhor consultar um site intermediário independente que ofereça pesquisa e opções.

Os corretores acreditam que todos vão se transformar em corretores digitais, mas na verdade vão apenas aumentar o grau de tecnologia de suas operações. Alguns poucos vão virar maquinas de vendas se seguros. Existe espaço para quantos sites de venda de passagens aéreas? Dez sites ocuparam todo o espaço, empresas bilionárias. Por que isto vai ser diferente no mercado de seguros?

Desta forma, portanto, vejo com grande desconfiança a proposta do governo de ampliar o acesso aos seguros. Pode ser mais uma intromissão como as que atrapalharam o mercado nos ramos de DPVAT, Acidentes do Trabalho e Saúde que está à beira do caos pelo excesso de regulamentação.

Quanto às duas outras propostas, vou comentar rapidamente.

Melhorar a qualidade dos serviços. É uma boa iniciativa, mas o Governo vai precisar estudar melhor o Mercado porque os serviços de seguro são bons e com índices de reclamação muito inferiores aos de outros mercados e os ramos onde existem mais reclamações são os que foram objeto de regulamentação excessiva por parte do Governo.

Conectar a massa de ativos do Mercado Segurador aos grandes projetos de desenvolvimento nacional – acho melhor não comentar sobre isto. Se há uma coisa que os seguradores sempre tiveram pavor é o Governo pôr o olho nas suas reservas. Deus nos livre.

Escrito por Nelson Fontana [email protected], advogado e corretor de seguros, em 09/10/2023.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui