Redução das tarifas de planos individuais é positiva, mas deve levar à judicialização
Por unanimidade, a diretoria da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) aprovou uma redução de 8,19% no valor das mensalidades dos planos de saúde individuais. É a primeira vez que a ANS aprova um reajuste negativo em seus mais de 20 anos de história.
A decisão da agência reguladora está diretamente ligada à pandemia de covid-19. Ao longo de todo o ano passado, observou-se importante redução na busca por procedimentos médico-hospitalares não urgentes pelos clientes individuais das operadoras de plano de saúde, o que levou a uma queda de cerca de 20% das despesas destas empresas. Como a tarifa dos planos individuais é calculada pela variação de custos médico-hospitalares e pela variação de despesas não assistenciais em relação ao ano anterior, a redução aprovada pela ANS no dia 8/7 se justifica.
“Ao longo de 2020, os gastos do setor com atendimento assistencial, oriundos de procedimentos como consultas, exames e internações, sofreram quedas significativas comparadas a anos anteriores, tendo em vista que o distanciamento social foi uma das medidas protetoras (recomendadas pelas autoridades sanitárias). Muitos beneficiários deixaram de realizar atendimentos não urgentes”, afirmou Rogério Scarabel, diretor-presidente substituto da ANS.
Convém deixar bastante claro que a decisão da ANS diz respeito exclusivamente aos contratos de planos de saúde individuais, que correspondem a apenas 18% do total de contratos das operadoras de saúde. Isto tem importância porque as tarifas dos planos de saúde individuais, minoritários, são diretamente reguladas pela ANS, de acordo com os critérios expostos acima. Já os contratos coletivos, embora sejam igualmente regulados pela agência sob outros aspectos, têm tarifas definidas a partir da livre negociação entre empresas contratantes e contratadas.
A inédita decisão da ANS é muito positiva para os clientes pessoas físicas ou microempreendedores individuais das operadoras de plano de saúde. Uma redução de 8,19% no valor das mensalidades dos planos – que são muito mais caras na modalidade de contratação individual – é um alívio e tanto para o orçamento das famílias. Em sua grande maioria, as contas dos lares brasileiros foram severamente abaladas pela alta da inflação, pela queda da renda ou mesmo pelo desemprego durante estes difíceis 16 meses de pandemia. Por outro lado, a decisão suscita pressão das empresas e associações do setor por um tratamento mais equânime por parte da ANS.
Enquanto os planos individuais tiveram reajuste negativo aprovado pela agência reguladora, os planos coletivos serão majorados entre 15% e 20%. Marcos Patullo, advogado especialista na área de saúde, ponderou ao Estado que, “se a redução de custos (para as operadoras) foi geral, por conta da ausência dos atendimentos eletivos, por que, para os (planos) coletivos o reajuste pode ser tão alto?”.
A ponderação é razoável. Afinal, embora contratos possam ser celebrados entre pessoas jurídicas, quem busca atendimento médico-hospitalar, por óbvio, são pessoas físicas. Ao fim e ao cabo, todas estão submetidas aos receios e restrições trazidos por esta pandemia. Logo, é lícito inferir que, em boa medida, a baixa procura por atendimentos médicos não urgentes ao longo de 2020 não teve relação direta com a natureza do plano de saúde contratado pelos usuários, mas sim com o receio destes em se expor ao risco da contaminação pelo coronavírus em situações nas quais esta exposição não era mandatória.
A recente decisão da ANS deve aumentar o apelo de órgãos de defesa do consumidor e de associações representativas do setor para que a agência também passe a regular as tarifas para os planos de saúde coletivos. “Fica nítido que deixar o mercado sem regulação (da ANS) não produz reajustes mais baixos”, disse Ana Carolina Navarrete, coordenadora do Programa de Saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
Positiva, a redução das tarifas para clientes individuais aliviará o orçamento de parcela muito pequena dos usuários de plano de saúde. Não será surpresa se a maioria, usuários dos planos coletivos, acorrer ao Poder Judiciário.
Fonte: Estadão, 26/07/2021.