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O PLC 29/2017 e o resseguro

O PLC 29/2017 e o resseguro

*João Marcelo dos Santos

O resseguro é o seguro das seguradoras. Pouco conhecido, ele é condição de existência do mercado de seguros, principalmente quanto a grandes riscos.

Não há seguradora no mundo com capacidade para assumir, sozinha, por exemplo, os riscos das maiores empresas do Brasil. Aí entra o resseguro, provedor de capacidade econômica e técnica para todos os mercados de seguros.

Os resseguradores têm sido apresentados como vilões, na discussão do PLC nº 29/2017, oriundo do PL 3555/2004, do então Deputado José Eduardo Cardozo. O PLC é uma proposta de lei que regula seguros e resseguros e revoga artigos do Código Civil. Essa revogação, aliás, é desnecessária e inoportuna. Temos um relativamente jovem e adequado Código Civil e não faltam regras no seguro brasileiro. Pelo contrário, há longo caminho de desregulação até um nível de intervenção estatal adequado. 

João Marcelo dos Santos é Sócio Fundador do Santos Bevilaqua Advogados

Sim, resseguradores têm interesse em seguros, sobretudo em PLC que trata igualmente situações como o seguro de celular, de plantas industriais e de obras públicas. Curioso é que, embora regule o resseguro de modo a tornar o Brasil motivo de chacota internacional, este nem é o principal problema.

Entre outros exotismos, o PLC proíbe a comercialização de seguros antes da aprovação de suas condições contratuais pela SUSEP. Não há nada parecido em nenhuma jurisdição relevante. Também inventa a categoria do independente “regulador de sinistros brasileiro”, que, na prática, limitará a responsabilidade, perante o segurado,  da seguradora, esta, sim,  sujeita a requisitos de capacidade econômica e governança e à supervisão da SUSEP.

O PLC consolida a proteção da inadimplência, quase só obrigando a pagar pelo seguro o segurado que tiver uma perda. Óbvio, o seguro ficará mais caro para os “incautos” cumpridores de suas obrigações. Prevê, a despeito do atual desenvolvimento tecnológico de empresas e consumidores, o envio de cartas registradas para lembrar ao segurado a obrigação de pagar pelo seguro.

Proposto em 2004, quando já era retrógrado, em 2023 o texto é dinossauro disfuncional que, trazido à vida, pode atrasar em décadas o seguro brasileiro.

Em suma, o PLC 29/2017 ameaça o acesso da sociedade brasileira ao seguro, que vem melhorando após décadas de exagerada intervenção estatal. Quem diz isso são brasileiros que moram no Brasil e atuam no mercado de seguros e resseguros, não um “oligopólio internacional” cheio de projetos maléficos.

A retórica do “eles, maus, contra nós, bons”, desconectada da realidade e aplicada a uma discussão complexa e objetiva como essa, é piada de mau gosto.

*João Marcelo dos Santos é Vice-Presidente do Conselho Superior da Academia Nacional de Seguros e Previdência, Ex-Diretor e Superintendente Substituto da Superintendência de Seguros Privados e Sócio Fundador do Santos Bevilaqua Advogados

Artigo publicado no Jornal O Estado de S.Paulo, 07/05/2023.

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